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Pawlo Cidade

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INVERSÃO DE VALORES, NUM MAR DE CONTRADIÇÕES

Paulo Moreira, vereador em Ilhéus na década de 80, tem um texto que ele costuma recitar ao falar das contradições que Ilhéus possui. Diz, animadamente, por exemplo que a Marinha tem sede na terra e o Exército tem sede no mar. Não sei se vocês recordam, mas houve um tempo que aquela prainha da 18ª CSM era muito frequentada pelos ilheenses. Tem também um taxista chamado “Sem Volta” que tinha o costume de fazer uma única corrida por dia no aeroporto. E um cidadão muito querido na cidade, de prenome Botafogo, que torce para o Flamengo! E por aí vai.
Mas Ilhéus é também uma cidade de inversão de valores. Minha amiga Mirian Oliveira, exímia contadora de histórias, me chamou a atenção para isso. Observe: Fechou-se o Hospital Santa Isabel e no seu lugar nasceu uma rede mundial de lanchonetes que faz fila no dia de promoção. Uma certa livraria tradicional, que por muitos anos encheu o espírito dos ilheenses — continua com o mesmo nome —, mas hoje enche a barriga das pessoas, pois ali também virou um restaurante.
Casarões históricos, prédios centenários são substituídos todos os dias pelos grandes comércios de janelas de vidro brindex e portas de correr. No dia da entrega da Comenda, privilegiamos mais políticos que os homens e as mulheres de nossa terra. É melhor fazer carnaval, que construir um hospital!

O Bataclan, bordel famoso dos anos 20 e 30, cenário do romance “Gabriela, Cravo e Canela”, também agora é restaurante. Casa dos Artistas, uma lanchonete enterrada pela coroa do hambúrguer. Pelo visto é melhor se alimentar do que é perecível do que encher a cabeça de ideias mirabolantes, destinos utópicos e experiências incríveis. Não é isso que a literatura nos proporciona?
Mas para quê ler, não é mesmo? Enchei-vos as panças e multiplicai-vos!
Não leiam. Não abram a página de um livro! Porque se vocês lerem vão acabar descobrindo que esta cidade é conhecida por suas histórias, por seus causos, por sua gente, por sua civilização. A civilização do cacau! Terra de quase meio milênio! Vocês têm ideia do quão isso é importante? Vocês têm noção de que estamos à beira de completar 500 anos?
Povo de memória curta, de tapa na cara.
Povo chinfrim, destas terras do sem-fim.
Povo trouxa, buliçoso!
“Povo lambisgoia que pescou siri de seripoia”.
Povo bobo, que vive enfiando a mão em cumbuca.
Povo espevitado, fica longe de arapuca!
Desperta, desperta, povo sabacu-de-coroa.
Povo de sono caipora.
Povo de pescoço duro.
Praia, rio, cachoeiras existem em muitos lugares do Brasil. Não estou insinuando com isso que não devamos cuidar de nossas belezas naturais. Pelo contrário, devemos po-ten-ci-a-li-zá-las!
No entanto, Jorge Amado, o escritor que nos levou para os quatro cantos do mundo — e seremos eternamente gratos por isso —, só temos ele aqui. Pawlo Cidade, Luh Oliveira, Fábio Lago, Lamartine Ferreira, Rodrigo Melo, Mestra Lainha, Romualdo Lisboa, Geraldo Lavigne, Geraldo Del Rei e tantos outros artistas só temos aqui.
Ah, e não venha pra cá me dizer que Jorge Amado nasceu em Itabuna, que eu provo a você que é mentira! Mas como é dono quem registra, aí não tenho como contra-argumentar!

Por: Redação O Tabuleiro
Dia 03/02/2025 10h51

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