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O Tabuleiro

Pawlo Cidade

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SEPARAÇÃO

Não é difícil explicar o fim de um relacionamento. Sempre se tem uma justificativa a partir da atitude do outro. Estas atitudes, muitas vezes pequenas, que podiam ter sido consertadas, evitadas, são as que esgotam a relação. O difícil mesmo é explicar ou tentar colocar no papel a dor de quem não desejaria o fim. De quem mais amava no lado da história. Talvez não se trate de quem mais amou, mas, de quem mais se entregou, de quem mais acreditou. Uma banda sueca que fez muito sucesso no final dos anos 70 e início dos anos 80, a banda ABBA, gravou uma canção que ficou muitos anos nas paradas de sucesso. A letra falava em separação. Dizia também que quem sai, quem vai embora, leva tudo. É o grande vencedor.

Outrora se dizia – e hoje até ainda se diz em alguns grupos ou extratos sociais que o casamento é para toda a vida. Meus pais me ensinaram assim. Mas a juventude contemporânea diz que se não der certo, separa, começa de tudo novo, separa outra vez e o ciclo se repete. Quando eu era jovem eu também pensava assim. Conheço uma senhora de 62 anos que a 24 anos perdeu o marido. Ele se foi, a trocou por outra. Há 24 anos ela sonha com a sua volta. Acredita piamente que ele irá se arrepender e voltará para seus braços. Fala dos momentos felizes que passaram juntos, de quão bom ele era e como cuidava dela. Se pergunta por que ele se foi. Amar assim é uma coisa rara. Em “O Amor nos Tempos do Cólera”, escrito pelo colombiano Gabriel Garcia Márquez, o protagonista Florentino Ariza, ainda muito jovem, que na trama é telegrafista, violonista e poeta se apaixona por Fermina Daza, mas o romance enfrentou a oposição do pai da moça, Coronel Nicolas, que tentou impedir o casamento enviando a filha ao interior numa viagem de um ano.

A história da solidão e do amor obstinado de Florentino espera Fermina por mais de 50 anos até que um dia se declara a ela no velório do marido. Meio século sozinho, sem deixar de pensar na amada um único instante.

Juan Rulfo, escritor mexicano, dizia que “todo escritor é mentiroso: a literatura é mentira, mas dessa mentira resulta a recriação da realidade”. Eu acho que eu esperaria 50 anos. Sou um desses românticos inveterados que ainda acredita no amor e nas pessoas. Choro do nada. Fico feliz com a felicidade do outro. Mesmo sem o conhecer. Sofro com o sofrimento e a perda do outro. Você pode até sentir a mesma dor de alguém que perde outro alguém, por qualquer motivo. Mas nunca será a mesma dor. É a vida. É o amor. Que possamos agir e viver com o Soneto da Fidelidade. E fazer nossas, as palavras do poeta Vinicius de Moraes:

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

 

 

 

 

 

 

Por: Redação O Tabuleiro
Dia 14/10/2019 07h20

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